Quanto tempo é o bastante para a arte ser considerada um trabalho? Para que o tempo que você gasta refazendo páginas e páginas de HQ ou os anos de estudo de teoria do design para melhor compor sua ilustração ou as várias noites de sábado em barzinhos inserindo suas próprias composições entre um ou outro cover da Marisa Monte ou as quase duas mil páginas de rascunhos de roteiros ou crônicas ou contos sejam consideradas a sua forma de viver, o seu ganha-pão?
A medida de tempo o bastante é… a utilidade.
Uma forma de arte é considerada trabalho no momento em que se torna útil: quando paga contas, quando gera empregos, quando mobiliza a sociedade. Ela é trabalho o bastante quando deixa de ser algo que se faz por prazer e se torna algo que cumpre requisitos, que fecha boletos, que garante status.
Mas seria isso mesmo?
À quadrinista, a arte se torna útil para ela quando a HQ traduz sentimentos de sua própria história. Ao ilustrador, ressignificar sua periferia em seu design arrojado que traduz suas raízes é ser útil. A música da cantora do barzinho encontra utilidade naquele instante em que conecta os enamorados que passaram a noite inteira se entreolhando. Ao escritor, em seu cárcere político, as ideias metamorfoseadas em mitos se tornam úteis à revolução social que se configura além de suas barras.
Todx artista sabe: a arte é útil por si, além de ganhos ou deméritos, pois salva aqueles que a fazem e aqueles que são tocados por ela.
A Arte é o bastante.