Scott McCloud, em seu livro Desvendando os Quadrinhos, define arte de uma forma muito ampla (e simples): “qualquer atividade humana que não se desenvolve a partir dos dois instintos básicos da nossa espécie: sobrevivência e reprodução”. Questionável de muitas formas – principalmente aos que contestam o quão espiritualmente “boa” deve ser a arte, o quanto esta pode ou deve estar ligada a sentimentos, sensações e intenções engrandecedoras – mas, ainda assim, reveladora.
Apoiando-se no argumento de McCloud – e desconsiderando temporariamente toda a complexidade das relações humanas -, se pararmos pra pensar, a arte é nosso fundamento enquanto seres sociais. Pois não nos cabe fazer somente a linha direta e objetiva de “sobrevivência e reprodução”. Queremos mais, desejamos mais, buscamos mais: tentamos nos expressar em nossas ações e emoções, percorremos as possibilidades no ínterim entre o belo e o grotesco para nos encontrar e agirmos de forma única, de forma artística.
Qualquer ação humana possui a assinatura da “artista” que a executou, seja ela realmente reconhecida pelo termo ou não. Desde as coisas grandiosas, como os detalhes dos salitres dos prédios, às cores das salas de cinema, à apresentação da refeição na hamburgueria favorita, até aqueles detalhes quase despercebidos de nossa rotina: o sorriso de bom dia da pessoa amada, as cócegas na barriga da criança, o afago carinhoso no bichinho de estimação, a troca de olhares silenciosa durante a dança, o beijinho-cheirinho cearense no encontro dos queridos… desejos de arte não reconhecidos, amorosamente escolhidos pelo coração que palpita, pelo calor que une, pelos gestos que aproximam.
Talvez, de forma ousada, devemos ressignificar a definição de McCloud: “qualquer atividade humana é arte”.